sexta-feira, 31 de outubro de 2008

ouvi dizer

Ouvi dizer que vai nevar em Paris!

E teve sim uma época em que eu gostava de Rita Lee, essa época já faz tempo, foi em outro verão, outro inverno longe desse, que é agora mesmo tão novo, tão desconhecido como fora outrora o verão de Rita o inverno Lee que passou trazendo mesmo assim sentimentos não antes sentidos. Talvez sentir sentimento seja sempre novo e desconhecido e ler Clarice talvez seja assim ler sempre o novo do que já sabemos de nós.

Ele nunca mais ligou, desde a despedida no mêtro, onde ele anunciou-me o inverno encapotado em seu comprimido mantô, e eu ainda não sabia que estava assim tão próximo o frio de mim. E estava.

Meu computador agora escreve em francês e acha assim todas as minhas palavras erradas. Isso por que muito depois do tempo em que eu gostava de escutar Rita Lee eu decidi vir a Paris.

Ele não fala a minha língua. Eu não conheço as suas palavras. Eu não sei a onde ele está agora. E eu não sei como chama-lo de volta.

Queria eu ser artista, dessas que pensam, que entendem. Que são incompreendidas. Que fazem sucesso póstumo. Que enlouquecem de amor Claudel Camille Rodin, Picassianas…. Apaixonadas por deuses. Mulheres. Não sei se sou artista. Mas gosto de pensar que um dia serei. Para impressionar papai e suas estátuas de Brecheret que choram em silêncio no jardim da Quarto Centenário.

Teve um dia em minha vida que eu ouvia walkmen no quarto escuro e fumava cigarro de menta escondido, foi até antes mesmo da época de escutar Rita Lee, lá eu escutava Marina Lima e Lobão, essa noite não. Mas logo logo depois Lança Perfume e todos os amores do mundo eram possíveis. Hoje não. O verão aqui acabou. Ele, eu não sei se volta. Mas desejo ainda dançar um último tango em Paris. E danço. Enquanto há chuva lá fora. Palavras correm nas veias poetas. Paris surpresa. Tão diferente.Eu de mim mesma. A mesma que ouvia Rita Lee.

Queria eu ser grande e escrever histórias e sofrer bastante e ter a poesia como aliada.

E descobrimos outro dia mesmo aqui na França, e ao mesmo tempo no Brasil, nós que aqui pensamos. E os já ficaram muito tempo neste mesmo lugar a pensar e também vão pensar assim os que estão por vir, que a vida, essa que passa pelos os olhos nossos, a vida meus amigos, não faz sentido nenhum ! (nenhum ?) E a grande angústia é a de tentar a cada dia dar um sentido quando mesmo assim importante para nossa real insignificante existência !Triste ? Era um pouco mais fácil na época da Rita, sim com certeza, mas lá mesmo, na época Lee Lee, achava eu, insuportavelmente sofrida minha existência incompreendida por todos ao me redor. Existir. Pode ser assim mesmo tão cruel ? Será então melancolia ? Será então o que ? Será Paris e sua a chuva bellepersonne? A solidão! Mais nova companheira mesmo ao redor de tantos. Novos. Novas. Eu sou cada vez mais só. Maior. Não não… a vida é mesmo assim. Sem sentido, cor de cinza inverno.

Mesmo ele não ligando. Não vindo. E mesmo mesmo se ele não mais quiser. Nem um outro tango em Paris. Ainda tenho minhas horas de sono sonhando bom. Com grandes vestidos de cor azul e boas risadas em companhia de outras tão forte, como eu, amigas. Onde posso encontrar novas forças e a beleza que me apaixona os olhos. E a confiança na primavera que sempre chega mesmo quando o frio parece eterno.

Paris Paris grande amiga e companheira durmo em seus braços e ainda espero ser levada. A falta de sentido é justamente onde mora o caminho. De alguma outra coisa que não se pode dizer em palavras e por isso dizemos que não há sentido. Mas há a beleza e ela esta sempre lá, aqui e aí. E ainda há amanhã. E logo logo esse inverno passa. Como passou a Rita. Como passou o camino. Os girassóis. Os cigarros de menta. O medo do escuro. Os amores escondidos. As lágrimas escorridas. A raiva sentida. A paixão que levita. E tudo fica. Escrito aqui nas minhas linhas e tudo isso vira. Aquilo que enxergo da minha fotografia.

No rádio o homem fala francês.As pessoas na rua também. Até eu ás vezes tenho falado francês.

Hoje fui ao Pantheon. Coisa mais linda. Ver tantos homens mortos que um dia sonharam além. E escreveram idéias em forma de palavra e tentaram mudar o mundo. Voltaire, que tinha ciúmes de Rousseau. Zola que acusou. Jaures. Que era até então para mim nome de uma estação. Victor Hugo que também ali estava. E o relógio de Foucault. E também ouvi e vi novos jovens do teatro, já mais tarde, não mais no Pantheon. Tão bonito ver artistas novos. Nossos contemporâneos. E também falei com papai no telefone e me deu saudade da época em que a gente estava mais perto, aquela época da Rita Lee, e do vestido branco da festa de 15 anos. Já faz tempo esse tempo. Já passou muita coisa, quase 15 anos…

ih minha mãe agora vai me dizer que eu já estou velha, que devo logo logo dar um sentido na vida, talvez mamãe ainda não saiba, ou ninguém disse a ela, que a vida, lembra daquilo que eu falei sobre a vida… minha mãe quer logo me dar sentido, filhos, marido e profissão, um alguém para desfilar por aí e dizer que é essa a Flávia que eu bem virei e assim ela poder dormir tranqüila, triste vai ser quando ela descobrir que nem assim ela vai conseguir aplacar a angústia de seu coração, justamente por causa da descoberta que fizemos outro dia sobre a vida, aqui na França e também no Brasil e talvez em outros lugares, e que já fizeram esses outros poetas que aqui habitaram em outras épocas, que convivem ainda como fantasmas coloridos pelas ruas históricas da mais bela cidade do mundo que mesmo na chuva fria e cinza, mesmo sem tocar meu telefone, amor interrompido sem eu entender por que não beija mais a mim. Ainda sim és paris a mais bela. E sou eu ainda a mesma outra pequena e grande, forte e frágil, inteira e multifacetada. Bailarina atrapalhada. Em lágrimas de saudades e arroubos de vontade de ser além. Nova temporada. Ainda tenho tempo e caminho em terras estrangeiras. Ainda há uma nova música e um outro novo tango na mais nova paris. De amanhã.

Obs:Me despeço ao som de Blue Moon que por acaso canta deliciosamente no meu rádio francês enquanto vos escrevo essas linhas carregadas de saudades, fazendo três graus nas ruas parisinas com promessa de neve para o próximo fim de semana!

Carpe diem!
Amo logo
Sinto
Sinto logo
Existo!

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