domingo, 19 de abril de 2009

sabado, dia 18 de abril, choveu sem parar em paris...

quando vi seu recado já tinha ido afogar a minha crise na rua. na chuva. peguei o metrô. e fingi pra mim mesmo que a vida ia continuar amanhã. e vai. não entendo. tem dias que faz sol e é só neles que eu quero viver. talvez ele não goste de mim. talvez ele me ame demais. eu não falo francês. ele sempre ganha o jogo. eu não sou atriz do cinema francês e não serei. nasci em são paulo. são paulo é longe daqui. paris esta noite. fui pra rua. fui toda valente. tava chovendo. desde que eu acordei. sabado, dia 18 de abril, em paris choveu sem parar. eu fico muito sozinha em paris. mesmo estando com muita gente. eu sei muito pouco sobre o meu futuro. ontem a noite morreu um amigo. amigo meu. amigo de outros amigos meus. ele falava umas coisas bonitas. lembro da primeira reunião política que participei (não participei de muitas na minha vida, não sou um ser político.) mas nessa ele estava lá. com o seu inconfundivel óculos escuros, que escondia talvez a insônia de mais uma noite não dormida. reinanldo maia. ser do teatro. desses eternos. pra sempre. falava bonito. acreditava em um monte de coisa que ninguém mais acredita. se indignava. inventava qualquer motivo para poder falar daquilo que lhe afligia o peito. tinha gostado da minha peça, aquela que foi um fracasso. ele gostou. falou bonito. escreveu bonito. era um ato de companheiro, de camaradas. o nelson me contou que ontem a noite o galpão do folias d'arte, lá no centro da cidade de são paulo, estava repleto de gente. até o pipoqueiro foi vender pipoca. foi o velório do maia. ele tinha muitos amigos. se eu estivesse em são paulo eu estaria lá. eu queria estar em são paulo. com os meu amigos. mas essa noite estou em paris. e em paris chove desde manhã. e eu não fui convidada para festa parisiense descolada. eu fui ser estrangeira. desconhecida. solitária. exótica, por que não? pour quoi pas? je m'en fou. a vida passa rápido. hoje chove. e eu não estou alegre. amanhã talvez faça sol. talvez eu sorria um pouco mais. eu sorri hoje. mesmo estando triste. a vida. tenho mesmo que inventa-la. a cada dia. e ela é cheia de surpresas. das mais incriveis. daquelas que a gente nem possa imaginar...

quarta-feira, 15 de abril de 2009

espera tua

nunca foi fácil continua não sendo encontrar-te requer paciência
e como se eu conhecesse o caminho dos nossos passos a frente
espero te calma e silenciosa porque sei do nosso inevitável reencontro
mas não quero te gastar quero te fazer pouco pouco
nunca cotidiano sempre dia de festa gravata e vestido novo
telefone que toca e não encontra você liga e eu não atendo
eu te ligo e você não atende até que uma hora é novamente possível
meu menino pequeno parisino de lábios pra sempre
de olhos medrosos de passos embaralhados de um querer que recua
e avança tantas e tantas vezes sou moça que veio de longe
a tentar-te o amor mas não te quero no sempre
nos temos quando já não se faz possível mais a tal espera
então me acalmo para poder de novo entregar-me a eternidade
desse sentar lorquiano das moças que ficam na calçada a espera
desse amor sem nome sem rosto mas com o gosto que elas tanto se lembram...

segunda-feira, 13 de abril de 2009

que venha!


é bonito
ver a vida escorrer
pelos dias
que se vão

é bonito
ver a música
se fazer no instante
do encontro das mãos

homem
senhor
menino

ver-te assim
abre em mim
caminhos
de quereres
caetaneanos

faz-se a música
e os encontros

o palco
é sempre
o mesmo
grandioso

ainda temo
os seus segredos,

mas o circo roda,
segue viagem

sou moça que foi levada
pelo amor a caminhada

vim longe,
vou ainda mais,

tenho pernas longas
e mãos que querem o mais!

sábado, 11 de abril de 2009

o contrário


de repente uma manhã de chuva
acordou em mim nesse sábado
de poitiers,
onde ainda resto,
pequena cidade francesa,
com um teatro amarelo,


mas acordou cedo esta manhã em mim,
eu que me disse dormir pra sempre
enquanto o sol acorda primeiro
de repente se fez assim o avesso
insônia matinal,
cinza e chuvosa,
mas aceitei-a na minha cama,
e me invadi de pensamentos
e espreguiçamentos sem fim,

e descobri que somos assim
o avesso do avesso do avesso sem fim

sexta-feira, 10 de abril de 2009

insomaniaque

minhas insônias pertecem a madrugada,

poderia dormir para sempre todas as manhãs que me restam...

quarta-feira, 8 de abril de 2009

la magie d'être!


Ce qui fait vivre les fleurs sont les yeux qui les regardent!

ao vento


algum outro lugar inventado de palavras existia escondido no sorriso que aparecia na timidez da boca tua

um lugar possível

onde o impossível encontrava sua cama para deitar-se largo e exato

para espreguiçar preguiçoso mesmo que curioso

dos contornos da minha carne fresca

era eu musa dos seus sonhos tropicais?

era eu algum lugar talvez

em sonhos sonhados em noites frias e distantes

sorriso velado e medroso

passos calculados e meticulosos

de uma dança estendida nos minutos de uma espera infinita

faço o que eu senão esperar-te

ainda e sempre e mais

que já nem sei mais a quem espero

ao vento talvez

que ele então me leve fresca e leve

sempre além.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

utopias

Lo Fatal - par Rubem Dario

Dichoso el árbol, que es apenas sensitivo,
y más la piedra dura porque ésa ya no siente,
pues no hay dolor más grande que el dolor de ser vivo
ni mayor pesadumbre que la vida consciente.

Ser, y no saber nada, y ser sin rumbo cierto,
y el temor de haber sido y un futuro terror...
Y el espanto seguro de estar mañana muerto,
y sufrir por la vida y por la sombra y

lo que no conocemos y apenas sospechamos,
y la carne que tienta con sus frescos racimos,
y la tumba que aguarda con sus fúnebres ramos
¡ y no saber adónde vamos,
ni de dónde venimos!...

desejo

Esperons!

Chegou em mim uma nova crise. Bombardeio de acontecimentos dos últimos tempos, dias viram anos, horas viram vidas, que são paridas em um novo corpo que começa a existir nas minhas velhas formas. Vendo o tempo passar pela janela, pergunto-me : para onde nos levam os trens?
Tenho que lutar diariamente com a minha mediocridade. Com a minha vontade de criação e a impotência de tantas vezes nada criar. Porque o que diferencia os seres humanos é exatamente o que deles se faz criação.
Fui ver, nesta última quarta feira, Jan Fabre no Théâtre de la Ville, em Paris. Não conhecia Jan Fabre, não sabia quem ele era e nem sobre o que ele falava. Amigos me disseram que eu tinha que ver, então eu fui. Como sempre fiquei uma hora e meia na fila de espera, porque esses espetáculos desses « megas contemporâneos » são sempre lotados, o que não significa de forma alguma que não haja lugares para os esperançosos. Gosto de ir ao teatro sozinha, e faço muito isso em Paris. Não foi fácil ver Jan Fabre, pelo menos pra mim, os amigos conhecedores riram gentilmente da minha inocência chocada. Pensei na minha mãe, que se chocou com a minha última peça de teatro em São Paulo, imagine você se ela encontrasse Jan Fabre ? Isso nunca vai acontecer ! Ainda bem que de alguma forma abri em mim espaços que me permitiram ir além, vir a Paris, ao teatro de la Ville, para poder ver e esse e tantos outros grandes artistas do nosso tempo. Talvez seja esse presente de papai, que mesmo tendo torcido o nariz, disse baixinho pra mim, quando assistiu a mesma peça que mamãe ficou chocada, o público não vai mesmo gostar minha filha, porque não vai entender, mas a critica vai falar bem, afinal isso é coisa de artista, artista contemporâneo ! E era, mas a critica paulista também não entendeu, vejam só, e pixou assim como boa parte do público a nossa suada criação, fomos enfim um fracasso, daqueles que nos marcam, tanto para o bem, como para o mal.
O público de Paris ontem ficou. Normalmente quando a peça choca assim, metade se vai. Ontem algo aconteceu, alguma pergunta deixou o público parisino imóvel em suas cadeiras, mas com certeza borbulhante em suas veias . Não mamãe, não tinha nada de bonito acontecendo no palco, era tudo feio e agressivo, não existia mais a possibilidade de sonhar com uma possível salvação, redenção, era posto e escrachado a nossa fracassada existência, o nosso fracassado sistema. E pior, ou melhor, num riso sarcástico, bem alto, desafiando qualquer crença que ainda restasse.
Jan Fabre diz : « Tudo se compra, se pode e se faz ! Tudo é normal. A pornografia entra em vossas casas por todos os canais midiáticos, a publicidade recicla o erotismo , o sexo se prática no telefone e a intimidade é exposta em toda parte. Onde está o verdadeiro desejo ? Nossa sociedade competitiva transforma o orgasmo em performance. Os valores se evaporam nessa normalidade triunfante. A extrema direita se coloca sem complexo. A humanidade se dissolve no mercado. O que resta do nosso ideal de beleza ? Do nosso idealismo ? »

Enfim, estava tudo lá desenhado em seu palco, de formas duras e riso largo. No final eles dançaram e Dionísio me salvou, enxerguei, mesmo diante à tanta descrença, um fio dessa tal beleza perdida, que ele me perguntou onde estava. Estava lá Mister Faber, no corpo humano pulsante dos seus bailarinos, que ainda querem dançar a beleza que há, mesmo que seja uma dança infernal.
Saí do teatro sozinha, sem saber o que pensar, liguei para um amigo, já muito mais andado do que as minhas pernas, mas ele não estava no momento. Pena. Queria o diálogo imediato. Fiquei no meu silêncio ensurdecedor. Peguei minha bicicleta e parti. De volta pra casa. Casa agora, Paris, o que muito me agrada. Pensei no Nelson, pensei no Marcão, pensei no nosso teatro.

Domingo fui assistir Maguy Marin, que também conheci nessas últimas idas aos teatros parisinos, nem sempre em Paris, diga-se de passagem. Mas Maguy Marin merecia mil viagens de trem para periferia. Sua criação, de uma beleza e crueldade que meus olhos conhecem simplesmente porque meus olhos são muito mais velhos do que a minha própria existência, e se fazendo mítico aquilo que se inscreve em cena, tudo em mim compreende. Maguy Marin é para os meus olhos o mais novo sonho. A existência possivel do belo, do cruel, daquilo que é, que respira, que pulsa, que recebe, que doa, que indaga, que ainda sonha. Feminino, por que não ?

Hoje o trem que eu peguei na Gare Montparnasse me trouxe a pequena cidade de Poitiers, no caminho, mil coisas na minha cabeça. A constatação da mediocridade que existe em mim. A vontade de gritar. Fuck you ! Como ontem gritou Jan Fabre em mim ! Fuck you Jan Fabre ! Fuck you ! A vontade imensa de criar meus próprios caminhos. A minha poesia.

Ariane Mnouchkine, com quem estive no último inverno, disse que acredita que estamos entrando em uma nova era, um retorno a gentileza, as utopias, a beleza. Aos ritos. Acho que prefiro descansar nas palavras de Ariane. Não que Jan Fabre não tenha para mim extrema importância e todo o meu respeito. É justamente ele que me deixa sem dormir, enfim. Mas sou menina e aprendi a gostar dos contornos mais sutis.

A verdade é que nos últimos tempos tenho estado com pessoas muito especiais, desde as mais celebres, as mais anônimas, todos inscrevem em mim memórias para o amanhã. De novas amizades, parcerias e amores. Amigas que partem ainda cedo. Parcerias que se criam, para ainda futuro. Vizinhanças que se aproximam sempre e mais. Paixões que retornam em sábados de madrugada primaveril de gravata cor de rosa e gosto de champange nos lábios que me tentam ainda e sempre e mais, vontade de dançar um último tango em Paris. Dançamos então ! Viva viva esses encontros de vida ! Viva viva curso de salsa as cinco da matina no meu salão ! Viva viva a união franco brasilina que alarga os corações ! Viva Maguy Marin ! Jan Fabre ! Fernando Eichenberg ! Ariane M. ! Erica Montanheiro ! Mrs B. ! Viva viva essa Poitiers que chegou hoje em mim ! Viva viva essa tal mediocridade que me dá ganas de querer mais e mais ! Viva viva Florentino ! Viva Baskerville, eterno sempre em mim ! Viva toda uma saudade ! Viva viva aos viajantes, e principalmente um viva para aqueles que tem coragem !